Eu queria um dia escrever sobre meu amigo Luís Mulher com a mesma habilidade que ele escreve sobre seus amigos. Adoro seu blog, muito embora raramente faça um comentário. Gosto da forma irreverente como ele se relaciona com o universo e as letras porque a cada vez que leio ou o vejo, sinto-me no encontro com minha vida, com o meu universo. Ali, em cada linha está parte de cada um de nós. Talvez seja a forma mais disfarçada que esse covarde tem de dizer que nos ama. Li o texto que reproduzo abaixo com a enorme satisfação de sempre para que os poucos que leem o que posto, sentir um pouquinho da emoção que sinto quando leio as bobagens de Luís.
Aqui está o link de seu blog: http://hotelsubterraneo.blogspot.com/
GERALDO ( VULGO "G.G. GONZAGA", "LEREU", "GENERALDO")
Duas moscas gordas esperneavam dentro do copo de cerveja. Minha mãe falou: "Seu Geraldo, caiu umas mosca aí no seu copo". Geraldo elevou o copo na altura da cara. Olho-o com uma típica desaprovação de beiço. "Essas inseta vão beber agora é dentro do meu bucho" - e virou o copo na frente de três gerações da minha família. A cena acima se passou na varanda da minha casa, após um bucólico almoço preparado por minha mãe. Era um sábado e ela acabava de conhecer o Geraldo. Eu sabia que isso poderia acontecer. Conheço os modos desse velho há muito tempo. Não foi a primeira nem a última presepada. Consta no seu currículo até a apologia ao incesto durante outro almoço no seio de outra família. Não tem jeito. Ele fala o que pensa. Na lata, sem concessões. E também faz o quer com sua vida breguessa. Tanto que se mandou de Manaus e veio morar em Imperatriz. É o mestre dos apelidos – foi ele quem me apelidou de "Luís Mulher" – e o doutor da mentira paulatinamente transformada em verdade – espalhou tanto o boato de que o Carlinhos namorava o Iuri que muita gente acreditou. Nem os filhinhos do segundo casamento escaparam: Maria Fernanda ganhou a alcunha de "Má Fé" e Jorge transformou-se em "Coco" (como se vê o Geraldo não vale um relógio usado das bancas do Troca-Troca). Também é um exímio comprador de velharias. Moto velha, carro velho, bicicleta velha, tudo que funciona precariamente lhe interessa. Há quem diga que ele teve um affair com o João Ricardo, um estudante de administração de São Luís que passou pelo CESI/UEMA. Ele não afirma nem nega. Apenas sorri e diz que já vai para o oitavo cu.Toca violão e dá pitaco em som como só ele mesmo. Qualquer equalização que não seja a sua é irregular. "Ei, tá muito estridente", ele grita da mesa do bar e depois se levanta pra "arrumar" o som da caixa amplificadora. O Geraldo é um humilhador caridoso. Lembro que quando a gente era um bando de desempregado, geralmente ele pagava as contas dos bares sozinho. Antes, porém, ele pedia contribuição dos presentes. Como pouca gente contribuía, ele sacava algumas notas do bolso e as espalhava sobre a mesa. Depois olhava pra gente e dizia: "Quem tem bota, quem não tem tira". Caso alguém persistisse em não contribuir com a vaquinha, ele interpelava: "Então tira!". Aí, quando o liso tirava alguma nota de cima da mesa (e era obrigado a tirar), ele dizia: "Agora bota!". O Geraldo também é um entrosado. Gosta de andar com gente jovem. Uma vez o vi descendo a ladeira Beira Rio rodeado de pivetes, com uns braceletes de metaleiro nos braços, indo para um show na antiga Usina. Em outro show de rock – este de rock evangélico, diga-se – ele começou a pregar a favor do diabo no meio da massa de fiéis. Na praça da cultura ele tomou o microfone das mãos de um vocalista de uma banda punk e falou que, depois do show, todo mundo estava convocado pra ir com ele pras Quatro Bocas de Fumo. Quer ser pra sempre um rapazola, esse Geraldo. Afinal ainda lembro que durante uma mostra de poesia regada a álcool e música na UEMA, após ler alguns poemas que estavam pendurados no mural em frente ao DCE , o Geraldo olhou pra mim e falou sério, com seu chiado amazônico: “Luís, aconteça o que acontecer na vida, eu só não quero perder a jovialidade”. Não perderá, meu velho. Não perderá.